domingo, 17 de março de 2013

M. Vargas Llosa


trecho de entrevista de Mario Vargas Llosa ao Estadão http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,descrente-radical,1009781,0.htm
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O efeito pernicioso avançou no tempo e chegou aos nossos dias, quando é cada vez mais escassa a figura do intelectual, concorda?

Totalmente. Esse é outro fenômeno inquietante de nossa época. O desaparecimento do intelectual significa também o desaparecimento das ideias e da razão como um fator central da vida social e política. Hoje em dia, as ideias foram trocadas pelas imagens, que são mais facilmente manipuláveis. Isso é uma grande ameaça para a democracia, pois uma sociedade com escassez de ideias tem suas instituições sob forte risco.
O que o senhor pensa sobre o poder das redes sociais?
Por um lado, há um aspecto positivo, pois as redes sociais aumentaram o poder da comunicação e da informação. Também dificultam a instauração da censura, como acontecia na América Latina há 40 anos - as redes sociais rompem qualquer controle. Por outro lado, o excesso de informação leva à confusão. Parece que vivemos em um bosque confuso onde não sabemos como nos orientar com segurança. Isso porque hoje em dia praticamente desapareceu uma instituição que, no passado, cumpria uma importante função na vida cultural e política: a crítica. Nas redes sociais, não há uma valoração da informação seguindo hierarquia tradicional, que distingue o essencial do secundário. Daí a confusão a que me referi antes.
E qual seria, nesse caso, a função da religião? O senhor sempre defendeu uma vida espiritual plena, mas sem nenhuma identificação com o Estado, certo?
As religiões, sem exceção, são intolerantes, pois trazem verdades absolutas, o que não combina com o espírito democrático. Ao mesmo tempo, uma democracia sem uma vida espiritual se converte em uma selva, como já disse Isaiah Berlin, em que os lobos comem todos os cordeiros. E, para que a cobiça e ambição material não regulem a vida, é preciso alimentar a vida espiritual. Mas o Estado não pode se identificar com qualquer religião - a história é pródiga em exemplos nefastos como perseguições, intolerância, inquisição. É importante ter um Estado laico com liberdade religiosa.
O que o senhor espera do novo papa, Francisco?
Espero que inicie o processo de modernização da Igreja, libertando-a de anacronismos como não tratar de temas como sexo e mulher. Caso contrário, vai continuar perdendo audiência. Os problemas com pedofilia que quase destruíram a Igreja nasceram dessa intolerância ao sexo. E Francisco parece ser moderno, com atitudes mais congregacionais.
Por falar em sexo, no livro A Civilização do Espetáculo, o senhor defende o erotismo como obra de arte.
Sim, o erotismo é resultado da cultura que, vinculado ao sexo, é transformado em uma atividade criativa. O erotismo é uma manifestação das civilizações e acontece em sociedades que alcançaram um certo nível de progresso humano. Por isso que cito muito Georges Bataille, defensor desse pensamento: ele sempre foi muito reticente à permissividade total, responsável por matar as formas, o que levaria o homem a retornar à uma espécie de sexo primitivo, selvagem. Infelizmente, isso ainda acontece em nosso tempo. 

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