sábado, 4 de agosto de 2007

VIEIRA NEM BEIRA ENTREVISTA O POETA DAND M

conheço dand m. faz um tempo. foi ele quem levou pra casa o primeiro prêmio iap de literatura, em 2002. daí são minhas primeiras notícias sobre o cara que agora em 2006 ganhou outra vez o direito de ter livro seu publicado pelo instituto. mesmo assim, poucas vezes nos encontramos. e numa dessas poucas enchemos a cara com muito chop, em certo lugar, digamos, impróprio. então, recentemente resolvi entrevistá-lo, o que resultou em mais uma boa conversa. confiram...


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vieiranenbeira: como nasceu dand m. a palavra em si, ou em quem?



dandm: A palavra "Dand" me indefine há muito. Mas não recordo como se deu ser chamado por este nome.



vieiranenbeira: li teus poemas, neles há fome. o leitor partinha na leitura a fome que é tua. tua fome feita pão e dividida entre autor e leitor. qual dos dois come o maior pedaço da fome?



dandm: Eu, obviamente. Mas há muito deixei de alimentar-me da fome. Hoje devoro a gula, por isso escrevo menos. O leitor "é o luxo de minhas veleidades", como escreveu certo poeta.



vieiranenbeira: 1° livro, flores, 2° livro, branco, em qual livro começa o final do outro? ou em qual final do outro começa o ouro?



dandm: Na verdade, trata-se de dois monolitos silenciosos: "Flores da Campina" faz parte da trilogia "Mea Ossea Poezia", enquanto "Branco ou 33 Poemas Diluídos" compõe a trilogia "Lorena". Portanto, matematicamente, eles não se tocam. Mas como mensurar o limite da poesia, esta "pluma negra solta no ar"?



vieiranenbeira: prefiro perguntar degustando santa helena. até que nunca se prove o contrário o desequilibro é o que nos corrige . Tem gosto de álcool ou de que o abismo?



dandm: De álcool, de água, de esperma, de pétala, de queda – precisa-se apenas saber voar.



vieiranenbeira: tarde tem fim?



dandm: Oh! As longas tardes crepusculares... Penso em Antmor, meu dileto...Sim, as tardes eternas se acabam para sempre, como um poema embalsamado e sem fim.



vieiranenbeira: esta sombra longa que nos cobre a todos, e que passa por nós a cada dia (a que os homens chamam noite), passará um dia?



dandm: A noite é avatar do tempo. Portanto, não posso mensurá-la – apenas atravesso-a.



vieiranenbeira: não fosse o lixo que seria do rato? não fosse o rato que seria do gato? não fosse o gato que seria do cão? não fosse o cão que seria do homem? não fosse o homem que seria do homem?



dandm: Metaforicamente, sem o "homem", (como dizê-lo?), existiria a possibilidade da desconstrução da Guerra, da Raça, de Deus, da questão em si. Lixo, rato, gato, cão, homem, nada são senão instrumentos do Homem: mesmo ratos podem ser menos malignos que Deus. Vide as guerras santas, a Inquisição, o silêncio nas fronteiras do Vaticano.




vieiranenbeira: mulher machuca?



dandm: Todo ser é ferido.



vieiranembeira: dia desses cravei os dentes na coxa da mulher, do canto da boca de carne um filete de sangue desceu vivo feito sorriso. mas sorriso com o tempo apaga? ou melhor, dilui?



dandm: Isso me remete a Lorena, Gioconda, Marilyn Monroe, Dorian Gray e Lestat. O sorriso é o véu do insondável.



vieiranembeira: quem são teus poetas. os que com arco e flecha te rasgam o ombro?



dandm: Por destino, padeço de Trakl, Guimarães Rosa, Age, Breton, Macku e outros poucos que me fogem à lembrança.



vieiranembeira: mesmo que não haja futuro no futuro, há outros livros para lançar ao ciclone?


dandm: Sim, os inéditos da duas trilogias e um mais recente que comecei a erguer, sob o título "Porcelana de Ossos".

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ps. aguardem a pubicação aqui de minhas impressões sobre BRANCO, segundo livro de dand m.


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conversa entre poetas.

TROÇO SMILE






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nem aquilo nem isso
vermelho no centro
que bate indeciso
está aqui dentro
onde é tudo impreciso
mas na hora que entro
em meu próprio juízo
dele eu choro dentro
e depois me diviso
só assim eu adestro
meu rosto pro riso




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poemeto inediteto de pauloleto vieireto

OBSERVATÓRIO VÉSPER

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disse pra eu ter muito cuidado na hora da chuva e saiu pela estrada, descalça, desfeita. os cabelos no colo do vento e o desenho do corpo no vestido. o detalhe na parte mais côncava e dentro dela o convexo da concha. era o vento a imprimir em seu vestido o poema do corpo antes da chuva.





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inédito, paulo vieira.

NÃO É VÃO PENSAR EM NÓS COMO PAISAGEM

romy sato by simone bauch



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henri cartier-bresson




para romy sato


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é vão pensar em paisagens como saída
para clarear os olhos escuros
que nos tomam as faces
em noites apagadas

é vão saber que o beijo alcança a boca
se o corpo ainda fechado resiste
à pesada mão do amor
esmurrando suas portas

é vão desprezar a paisagem que já conhecemos
(pois muda-se sempre de onde a vimos
pela última vez, para onde acabamos de chegar)
assim, sem saber, passamos toda a vida
a conhecer a mesma paisagem

e mesmo que no reencontro diferente
nos pareça, é ainda ela exatamente igual a antes

agora nós é que estamos diferentes

portanto, não é vão pensar em nós
como paisagem secreta e iluminada
feito o libidinoso corpo dos animais,
sempre despido, mas que ninguém percebe.



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poema inédito de paulo vieira